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quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Leia este testemunho de vida de um FIRE e inspire-se.

Olá! Tudo bem?

Se é sua primeira vez aqui, conheça um pouco de minha história aquiaqui e aqui. Recomendo, fortemente, que leia também todos os posts deste espaço para sentir como sou, como penso, pois você pode se identificar com o Mente Investidora. Ler apenas um post pode te induzir a ter uma interpretação errônea de quem eu sou e como busco a independência financeira. Fica a dica. 

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Ontem, acessei o blog do Frugal Simples e me deparei com um depoimento muito enriquecedor e extremamente inspirador. Se você acha que sua vida é difícil, leia a transcrição integral do texto que fiz abaixo.

O relato é longo e muito detalhado. Mas vale a pena ler, mesmo que em etapas. Basicamente, conta a trajetória de uma pessoa que não tinha nada, nascida em uma família com vários problemas, mas que não se rendeu ao crime e alcançou nesta semana nada mais, nada menos, do que R$ 4.000.000,00 em patrimônio.

Ser FIRE no Brasil é difícil, mas é possível. O objetivo desta postagem não é insinuar, especialmente, para aqueles que estão começando agora sua jornada em busca da independência financeira que com R$ 100,00 de poupança ao mês, por exemplo, é possível chegar à marca do Frugal Simples. 

O escopo é demonstrar que com estudo, disciplina de poupança e paciência, deixando que o efeito dos juros compostos e do tempo atue sobre o montante financeiro amealhado, é possível criar um colchão financeiro. Pode ser que não seja suficiente para você deixar de trabalhar um dia ou virar empreendedor, mas pode lhe permitir realizar os seus sonhos. 

A fonte do texto encontra-se aqui.

Outro depoimento com o mesmo teor, você encontra aqui.


"Prezados amigos,

Cheguei ao quarto milhão em patrimônio. Precisamente cheguei em R$ 4.016.000,00 hoje. Contando tudo a preço de custo de aquisição (imóveis, casa da loja e o valor gasto no investimento da loja (500k).

Esse post é longo, tente ler quando tiver calma, atenção, espaço e tempo.

Ainda me lembro de investir na bolsa e alugar todas as minhas ações na mão, coisa pra ganhar cinquenta centavos a dois reais em um dia, mas também me lembro sempre de ir pro shopping a pé (pra economizar o ônibus) e passar a tarde toda com apenas um sorvete casquinha do mcdonalds de R$1 e apenas ficar lá a tarde toda "só olhando" e voltar a pé pra casa.

Acho que não tem um dia que eu não passe sem sonhar com o meu futuro e "minha próxima vida" dentro dessa vida, e sem lembrar do meu passado, e até sentir um pouco de orgulho dele.

A pobreza da minha família e a destruição precoce dela, deixaram marcas indeléveis na minha alma, assim como a saída do meu pai da nossa casa, e dos irmãos cada um para um lado, como alguns sabem, numa família assim, após sua separação o padrão de vida cai muito pra todo mundo, imagina pra quem não poderia perder margem alguma.

O meu pai estudou até a terceira série do primário, no sertão do nordeste, ele é praticamente analfabeto. A minha mãe diz que terminou o segundo grau, mas a mãe dela (a minha avó) sempre disse que ela desistiu no primeiro ano, e a minha mãe não tem um diploma de segundo grau e nem o histórico escolar, ela diz que nunca foi buscar na escola, então eu não sei e ela fica irritada quando eu pergunto. Quase nunca eles trabalharam de carteira assinada. O meu pai quase sempre viveu de bicos, e a minha mãe só trabalhou algum tempo na vida como recepcionista/telefonista, hoje em dia parece que essa profissão de "telefonista" não existe mais. Meu pai teve três filhos com a minha mãe, eu sou o caçula e tenho mais dois irmãos (uma mulher mais velha e o do meio), depois que se separou, meu pai casou rapidamente e já tinha um filho com a mulher, depois teve mais dois com ela (totalizando seis filhos). A minha mãe, pelo que parece, não vai conseguir se aposentar nem pelo INSS, eu não sei bem essa parte, mas o meu irmão que entende mais, disse que ela perdeu um monte de papel e pelo tempo que falta lá, não dá tão cedo, não nessa vida.

Não diria que minha infância foi infeliz, ela foi feliz até um certo ponto, mas a partir de uns 8-9 anos quando a gente compreende melhor o mundo e começa a querer algumas coisas e passar necessidades reais, ficamos limitados pelas nossas circunstâncias.

Tudo que eu queria era inacessível. Tudo, até o básico era inacessível. Minha casa chegou a ter água e luz cortadas várias vezes, dezenas de vezes. A gente puxava um fio da casa de um vizinho e ligava uma luz de 40W no teto pendurada. Eu queria mandar uma carta pro meu pai (sim, carta) e penava pra comprar um sêlo nos Correios. A gente ligava do orelhão de ficha, trocava duas palavras ou três e acabava a ficha e consequentemente a ligação. A próxima ligação era com uns 15 dias, ele tinha se mudado pra outro estado do país. A gente nunca teve telefone fixo em casa, depois da ficha passamos pro cartão telefônico, e basicamente tinha um orelhão para metade do bairro, eu cheguei a pegar fila pra falar do orelhão de cartão, e como tudo no meu bairro, dava briga.

Certa época, depois de vários cortes de água e sem dinheiro pra pagar, a gente (eu) tive que fazer uma emenda no cano principal da rua (cavando a minha rua era de areia) [a primeira vez que eu fui morar numa rua que não era de areia eu já tinha 16 anos e já estava terminando o segundo grau] e um "T"com um cano de meia pra dentro do nosso terreno, esse cano desembocava dentro de um tambor de plástico (quando eu tirava a tampa) e a gente cobria o tambor com um tapume e alguns papelões (pra o pessoal da cia. de água não ver), do tambor, eu colocava uma bomba "sapo" que ficava submersa dentro do tambor, pendurada por uma corda numa ripa que se equilibrava acima do buraco, dessa bomba eu mandava a água para a nossa caixa dágua, eu descia a bomba com a corda, quando ela batia no fundo do tambor eu suspedia ela e amarrava a corda, ela não poderia tocar o fundo do tambor, ficava suspensa na água.

A equação era bem complicada: eu não podia deixar o tambor secar mais rápido do que a vazão de água da rua, senão a bomba queimava, e também não podia encher muito senão ia transbordar e virar um lamaçal e a lama iria contaminar o interior do tambor. Então era uma trabalheira doida de tampar cano, desligar bomba e esconder tudo se alguém chegar na rua.

Eu fazia tudo isso sozinho, isso eu tinha uns 11-14 anos, eu tinha conhecimentos rudimentares de pedreiro, eletricista, encanador, soldador (o meu avô era pedreiro autônomo também), eu rezava pra ninguém reclamar do barulho da bomba, a minha mãe estava dormindo (só morava eu e ela), e isso era sempre na madrugada, às vezes esse procedimento durava 3-4h, eu me molhava todo, a bomba só desligava quando eu puxava o plug do soquete da tomada.

A nossa casa não tinha muro, era uma casa de tijolo branco sem reboco por fora, que só fez eu e um pedreiro, era um quarto-cozinha-banheiro, com um pequeno quintal com uma pia externa e a caixa dágua acima da pia, a gente tinha uma cerca de pau com arame, bem espaçado e a porta da casa dava direto pra rua, só tinha esse cercadinho pra nos proteger e eu ainda tinha aula no dia seguinte pela manhã, dormia na aula e ainda era zuado por isso.

Nessa época, o café da manhã era leite de saco tipo "C", café preto bem diluído e ralo e pão com margarina vegetal, isso era o jantar também. Pro almoço, comemos muito arroz com tomate e ovo, ou "carne de lata", aquela que você abre a lata com uma chave que vem nela. Você abre a lata e coloca pra fritar na frigideira com um pouco de margarina, eu achava aquilo intragável, mas era o que tinha pra comer.

Quanto ao ovo eu também não gostava, eu fui gostar de ovo depois de adulto, e depois de "fazer as pazes com ele", eu achava que tinha estourado a minha cota de ovo da vida toda. O melhor almoço pra mim era arroz, carne moída com catchup e suco tipo Tang laranja ou Tang Uva. As frutas que davam pra comprar eram banana e melancia de vez em quando. O resto (manga, jambo e goiaba) a gente pegava na rua mesmo. Na minha casa a gente tinha pé de goiaba e abacate então a gente comeu muito deles dois. Eu tinha um amigo que sabia subir em coqueiro e tirar coco lá de cima, era assim que a gente tomava côco. Ele jogava lá de cima, se estourasse a gente bebia ali na hora imediatamente pra não perder a água, se não estourasse a gente levava pra casa.

A pobreza é a exata transformação física da ignorância e da falta de educação e informação. Eu estudei muitos anos na escola pública, até que ela era arrumadinha, tinha uma boa biblioteca e muitos livros para ler a vontade, eu sempre lia um, devolvia e imediatamente pegava um ou dois para levar, e assim ia lendo um atrás do outro, o ano todo.

Eu ia de ônibus coletivo para a escola desde muito novinho e sozinho até a parada e na volta pra casa, esse ônibus eu comecei a pegar sozinho e voltar, além de caminhar muito, eu devia ter uns sete, oito anos e ia só com um caderno fininho na mão e uma caneta bic azul, passava por debaixo da roleta para não pagar a passagem (nem dinheiro eu teria). A minha primeira passagem de ônibus que paguei eu já estava no primeiro ano do segundo grau (e não poderia deixar de pagar, pois a escola era CEFET e todo o mundo sabia que aquela farda ali era de segundo grau). Eu andei de ônibus até terminar a universidade, eu passei dezessete anos inteiros andando de ônibus coletivo. Eu sempre tive apenas uma farda, nunca nem mesmo tive duas camisas do colégio ao mesmo tempo, e eu achava coisa do outro mundo quando sabia que algum colega tinha duas camisas, a meia era a semana inteira (a mesma meia) e o tênis geralmente era um topper bem surrado, assim como a calça jeans.

Raramente eu tinha dinheiro pro lanche da escola. Eu comia a famosa merenda do colégio público, em prato de plástico e caneca de plástico. No máximo eu comprava um picolé de gêlo de 10 centavos, ou pedia um biscoito recheado Bono de alguém, goles de refrigerante... Comer uma coxinha com uma lata de guaraná no recreio do colégio era inacessível para mim.

No meu bairro de infância a gente tinha três atividades de lazer: jogar bola na rua de areia colocando tijolos para ser o gol (e contando 4 pés de um tijolo pro outro), ir pra missa e jogar video-game na game (espécie de lan-house antiga), tinha mega-drive, super-nintendo, playstation 1 e nintendo64. Em 90% das vezes eu não jogava com o meu dinheiro, mas sim quando alguém pagava a hora e me chamava pra jogar com o segundo controle, até que de tanto frequentar o lugar, o dono me perguntou se no horário da tarde e da noite eu não queria trabalhar lá.

O cenário do meu primeiro emprego era assim, só falta a freezer com os picolés. Eu cheguei a apanhar pq desliguei a TV dos marginais quando a hora tinha acabado.

Eu poderia jogar o quanto pudesse se tivesse uma TV vaga, e poderia comer uns picolés de gêlo que tinha lá pra vender, e ainda ganhava uns trocados que nem lembro quanto era. Essa "locadora" (era assim que a gente chamava) era um empreendimento feito na garagem da casa de um motorista de ônibus coletivo que rodava apenas dentro da minha cidade, eu era o funcionário dele, o único, e alternava com a mulher dele (que estava grávida ou cuidando de uma criança pequena). Ele trouxe uma sobrinha mais velha dele do interior e me substituiu, também eu apanhei lá e ficou difícil continuar (alguns moleques andavam com facas, estiletes e até revólver .22).

Depois de algum tempo eu arranjei o meu segundo emprego, eu já devia ter uns 11-12 anos, e foi de assistente de borracheiro. Eu trabalhava com um cara que fabricava sofás no quintal de casa. A gente saía de carroça pelos bairros juntando pneus velhos ou comprando, as ruas eram de areia e cheias de lama, às vezes eu ia sentado embaixo no eixo da carroça, de costas para o jumento, vendo a rua passando pelo meu lado, batendo meus pés nas lombadas ou molhando eles na lama.

Repare no pequeno eixo entre as rodas, eu voltava sentado ali, porque muitas vezes em cima da carroça vinha com muito pneu, mas eu gostava de andar ali, era bem divertido, às vezes batia a cabeça no piso da carroça ou molhava os pés na lama.

Quando a gente chegava no quintal, cortávamos a borracha com uma faca bem afiada, fazíamos tiras bem longas com ela e íamos puxando. Com essas tiras a gente fazia todo o arcabouço do sofá e depois colocava o estofado por cima. O meu salário, esse eu lembro, eram exatamente R$2,50 por semana. Se vocês tentarem corrigir pela inflação, esse valor vai dar perto de R$10 reais, o ano era por ali entre 95-97. A minha mãe me deu dinheiro na mão umas 3-5x na vida, o meu pai até que deu algum, mas ele saiu de casa quando eu tinha oito anos de idade.

No meu segundo emprego, era mais ou menos isso que a gente fazia depois de cortar os pneus, a gente colocava as tiras de borracha deles aí onde está na foto e também na parte das costas do sofá. O aspecto do sofá que a gente fazia era bem pior do que esse da foto. O da foto está chique, mas não achei nenhuma foto com um sofázinho à altura do nosso. A gente não podia tentar cortar um pneu que tinha um nome "radial" nele porque ele tinha um arame de metal dentro que nos cortava e não ia servir para o sofá.

Quando eu era criança, o sonho da minha vida era ter uma camisa do Vasco, daquelas que a gente chama de "oficial". Eu nunca tive. Depois de uns três anos pedindo essa camisa pro meu pai, ele comprou uma pra mim "do camelô", daquelas de 10 reais, com um tecido horrível, que suava e era meio quente, o patrocínio eu lembro até hoje, era Ace, um sabão em pó de caixinha que nem sei se existe mais hoje. Eu usava essa camisa até pra ir na festa da igreja e no shopping.

Outra coisa que eu sempre quis quando era criança era fazer natação. Eu nunca fiz. Não havia dinheiro para isso. Eu também queria fazer futebol de campo ou estudar inglês em alguma escolinha de inglês particular, e adivinhem? Pois é. Eu fiz judô porque um amigo me levou após insistir muito, me deu um kimono cru que ele tinha usado e comecei, as aulas eram em outro colégio público e o professor deixou eu me misturar com a turma do próprio colégio. Eu não gastava nada, eu cheguei na faixa roxa e ganhei muitas competições, até campeonato estadual e regional, mas dada toda a minha condição de vida, física e nutricional, não tinha como treinar nem competir em coisas mais importantes como um campeonato nacional.

Eu tive muitos problemas dentários, eu tinha muita cárie, muita dor de dente, eu não sei se sabia escovar direito, ou era pouco, ou se minha alimentação era péssima mesmo, eu rolava noites e noites na cama chorando sem saber o que fazer, passando água gelada, água da pia, colocando pasta de dente pura em cima.

Naquela época dentista público era muito inacessível, o privado era caro, mas sobrava uns privados bem ruins, que acho que nem eram dentistas, eu fui lá umas 4x, o procedimento era um só, extração, era muita dor e sangue. Até hoje eu tenho medo de dentista, e fico taquicárdico só em sentar numa cadeira de dentista. Da última vez que fui em uma aqui, chorei ao final, só com a lembrança de todas as dores que eu passei na vida. Eu acho que foi por causa das minhas questões dentárias que conheci o que se chama por "desespero". Noutra época, um pouco mais a frente, eu caí no colégio, quebrando um dos meus dentes centrais superiores, esse dente ficou quebrado por muito tempo, isso me fez sofrer bastante e me deixou cada vez mais tímido e retraído.

Na adolescência eu era o que se poderia esperar, baixo, magro, desnutrido, com dente quebrado, cariado, retraído, tímido e sem nenhuma habilidade em absolutamente nada. Da adolescência até o início da idade adulta atravessei um deserto sexual praticamente absoluto, coisa que na minha época era bem comum (não sei como está hoje em dia para a molecada). Eu levava foras homéricos na escola, passei muita tristeza e humilhação nas questões amorosas.

Os primeiros beijos e as primeiras experiências sexuais foram com as amigas e conhecidas da rua e do bairro, gente que tinha crescido comigo e que eu eu conhecia desde que me entendia por gente, mas obviamente não eram grandes coisas, assim como eu era na época. A minha primeira namorada séria, legal e bonita eu já tinha uns 20 anos de idade e estava lá pro segundo ou terceiro ano da faculdade.

Meus amigos dessa época, tenho contato com muito poucos, estão em posições bem baixas na vida, o resto se perdeu na vida ou ninguém sabe onde tá, trabalhando no comércio, alguns andando de ônibus até hoje, ou com um carrinho bem velho de 10k e sem dinheiro pra gasolina. Um dos meus melhores amigos da época da locadora, da última vez que eu tive notícia (lá pra 2003) tinha sido preso pela PM roubando toca-CD de carro estacionado.

As meninas engravidaram cedo e casaram com um qualquer e ainda moram por lá, no mesmo bairro ou em outro bairro igualmente péssimo, sem estrutura e violento. Uma minoria absoluta conseguiu chegar na faculdade pública, em cursos sem expressão alguma, como Serviço Social, Letras Português ou Geografia, esses os que eram muito dedicados.

Eu sou muito agradecido por tudo o que passei na vida, pelo caráter que me formei, pelas agruras que passei, sem tudo isso que contei aqui (não dá pra contar muitas outras coisas devido ao espaço) é que eu sou o que eu sou, é que me encontrei e encontrei o meu destino, o que me tornei e o que nasci para ser. 

Não é que se tenha que alegrar ou sofrer com o passado, mas um passado de sofrimento e escassez é muito difícil de esquecer sem sentir uma coisa muito estranha por dentro, às vezes tudo que eu queria era poder voltar pro passado e poder ajudar o meu eu mais novo com algum dinheiro, um presente ou uma conversa.

Foi extremamente difícil e trabalhoso passar por muita coisa sem um guia, um mentor, dinheiro, exemplos próximos ou sei lá algo que tenha tido o mínimo de sucesso para me guiar. Eis que por isso eu quis fazer esse blog, pra tentar ajudar um mínimo que seja quem se encontra numa situação de penúria ou desespero. Eu não sei como eu dei certo na vida quando todas as chances estavam contra mim.

Teve um dia que depois de muito penar em matemática pra passar no colégio (eu estava na quinta série) um coleguinha me levou pra casa dele para estudar, eu nunca vou esquecer desse dia, eu estava em recuperação praticamente reprovado (naquela época o meu colégio público reprovava mesmo, e tinha até dois alunos reprovados na minha sala), era sem choro nem vela, e por causa de uma matéria a gente repetia o ano todo, todas as matérias.

Primeiramente o pai dele (que era militar aposentado da aeronautica) acho que cabo ou sargento, foi pegar a gente de carro (foi a primeira vez que saí da escola em um carro), nos levou pra casa dele, tinha um quadro branco na garagem da casa dele e uma mesinha, ele deu aula pra gente de toda a matéria da prova, na sexta, no sábado e no domingo, resolvemos centenas de pequenos exercícios e contas, esse pai dele dizia que era bom em matemática e pra ele devia ser mais simples do que pra gente, eu aprendi direitinho a matéria e passei na prova.

Depois disso descobri que esse meu amigo (ele nem tinha ficado na recuperação) ele já tinha passado, ele estava ali comigo simplesmente porque viu o meu desespero e resolveu ajudar, sem falar, pra melhorar, a gente ainda ganhou lanche durante os estudos, torrada de queijo e suco de laranja (algo inédito para mim) - ganhar um lanche durante os estudos e pra fechar com chave de ouro - ele ainda tinha um super nintendo que a gente jogou uns jogos de avião de caça já a noite. Foi a primeira vez que eu vi um vídeo-game fora da locadora, na casa de alguém. Esse era o meu amigo mais rico até aquela data, e o bairro que ele morava era 10x melhor que o meu, do outro lado da cidade e com rua calçada. Esse fim de semana eu sempre vou lembrar.

Eu fiquei pensando por muito tempo: "caramba, como deve ser bom ter um pai em casa, que ensina, tem um quadro e ainda faz lanche... se eu tivesse uma oportunidade assim com certeza seria um aluno muito melhor, ia passar de ano folgado e quem sabe tirar as maiores notas da escola" o que descobri depois que era exatamente o caso dele, mas tudo bem.

E agora voltando ao post, eu não sei bem o que dizer para vocês nesse momento. Essa semana foi muito nostálgica pra mim por tudo o que vivi. A chegada ao quarto milhão me emocionou um pouco, porque muitas vezes, na minha solidão e na minha vida cheia de privações eu me perguntava se um dia eu ia ser feliz, se um dia eu ia ter o básico, se eu ia ter uma namorada bonita, se eu ia ter um bom emprego e vencer na vida.

E hoje, dirigindo as intermináveis horas, eu senti uma sensação de alívio danada, eu lembrei de meu passado, de tanta coisa que passei e me veio uma grande sensação de alívio e dever cumprido, de ter vencido na vida e hoje ser o que eu sou. Eu nasci num lugar e numa família que tinha TUDO pra dar errado, todo um contexto desfavorável, problemas em casa com álcool, desemprego, violência, infidelidade conjugal (do meu pai) e mesmo assim consegui encontrar meu lugar no mundo. Também lembrei de uma grande amiga minha, que foi embora desse mundo por escolha própria, há alguns anos atrás, e que muito me aconselhou em várias questões, além de dar exemplo prático de vida, determinação e disciplina, eu acho que ela estaria bem orgulhosa de mim nesse momento.

Enfim, onde está então o segredo?

O segredo de vencer na vida? De ter muito dinheiro? De ser uma boa pessoa, um bom profissional, um bom familiar?

Onde eu guardei esse segredo?

No desejo ter uma vida melhor. No desejo da minha "próxima vida" ainda dentro desta. Se você não tiver um desejo muito forte que te faz pular da cama e enfrentar o dia, mesmo com fome, mesmo morando longe, mesmo tomando banho gelado as 05:30 da manhã porque nunca teve um chuveiro elétrico em casa, mesmo saindo de casa em jejum todo dia, porque ali nem tinha café da manhã e só iria comer as 09:30, se você não tiver essa vontade dentro de você, pulsante, batendo mais forte do que o seu coração, eu não sei se você vai conseguir. Um homem sem vontade não vai resultar em nada.

No desejo de descobrir o que se passa no mundo, na vontade de superar a pobreza e de nunca mais voltar para ela, seja a pobreza material, espiritual, intelectual, mental, pobreza de laços familiares e de significado na vida, pobreza de sonhar, de desistir antes da hora, de jogar a toalha, de desistir de viver, de se contentar com o muito pouco, na imensa vontade de tomar a minha vida e o meu destino em minhas mãos e vencer com os meus meios, sem precisar fazer nada ilegal ou derrubar ninguém e tampouco culpar terceiros pela minha situação de vida. Eu queria superar o meu bairro, eu queria muito uma vida melhor, uma namorada bonita, um carro, sem tristeza, sem fome e sem desesperança.

Eu venci a pobreza. Eu venci o meu destino. Eu estou vencendo na vida.

Obrigado a todos os entraves e a todas as pessoas que de alguma forma contribuíram bem ou mal para eu estar aqui. Sem tudo isso, eu não seria o que sou hoje.

Acho que é isso amigos,

Um grande abraço a todos,

Frugal."

Continuaremos nosso bate-papo no próximo post.

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Até mais!

6 comentários:

  1. Precisava ter copiado o post todo do coitado?

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    Respostas
    1. Olá, Anônimo!

      O depoimento dele é tão rico de detalhes que mereceu a transcrição completa, exatamente para os internautas terem a real dimensão de seu feito.

      Abraço.

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  2. Respostas
    1. Olá, Bilionário! Seja bem-vindo!

      Pois é. História de vida que poderia, facilmente, virar filme.

      Abraço.

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  3. Fantástico. Sou seguidor do Frugal Simples há algum tempo. Grandes lições de vida.

    Parabéns pelo post!

    Abraço.

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  4. Vou lá parabenizar o autor.

    Ótimo Post. M.i.

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